QUARTO MANDAMENTO

«Honra teu pai e tua mãe, como te mandou o Senhor, para que se prolonguem teus dias e prosperes na terra que te deu o Senhor teu Deus» (Dt 5,16).

A família é a primeira sociedade natural fundada sobre a união indissolúvel entre homem e mulher. Por isso esse preceito alude explicitamente à relação familiar. Seus normas, contudo, ultrapassam os limites domésticos e dizem respeito também à sociedade em si mesma, abrangendo a relação entre cidadãos e governantes, patrões e empregados e dos esposos. Portanto, o preceito positivo é o respeito à autoridade legítima, enquanto que o preceito negativo é a proibição da insubordinação e desrespeito pela hierarquia e pelos legítimos superiores1.

Qual o sentido da palavra «honrar»? Não basta obedecer aos su,erores, mas em ter apreço e nutrir o mais alto conceito de tudo o que se lhe refira (cf. Catecismo Romano III-V 7). Continua o Catecismo Romano:

Acompanham essa honra os sentimentos de amor, respeito, obediência e veneração. De caso pensado, empregou-se na Lei o termo “honra”, e não “amor” ou “temor”, apesar do muito que devemos amar e temer nossos pais. Quem ama, nem sempre respeita e venera; quem teme, nem sempre ama. Mas quem honra de coração, também ama e teme. (Ibidem).

Conforme mencionado anteriormente, este Mandamento diz respeito à autoridade cujo fundamento se encontra em Deus. Nosso Senhor ensina que toda autoridade vem de Deus, como está escrito:

Em seguida, desceu com eles [Jesus, Maria e José] a Nazaré e Ele lhes era submisso (Lc 2,50).

Respondeu Jesus: Não terias poder algum sobre Mim, se de cima não te fora dado. Por isso, quem Me entregou a ti tem pecado maior (Jo 19,11).

Toda a alma esteja sujeita aos poderes constituídos, porque não há autoridade que não venha de Deus; e os poderes que existem foram instituídos por Deus (Rm 13,1).

A autoridade primitiva é exercida na célula base da sociedade, que é a família, por isso o resumo deste preceito menciona o respeito aos pais «honrar pai e mãe»2. Como é da natureza humana viver em sociedade, não podendo, portanto, o homem subsistir no isolamento “nem se proporcionar o que é necessário e útil à vida, nem adquirir a perfeição do espírito e do coração” (Carta Encíclica Immortale Dei do Papa Leão XIII, 4), naturalmente se desenvolve a sociedade pela Providência que o fez “se unir aos seus semelhantes, numa sociedade tanto doméstica quanto civil, única capaz de fornecer o que é preciso à perfeição da existência” (Ibidem).

A mesma Encíclica destaca a necessidade de uma autoridade para governar as sociedades humanas (doméstica ou civil) e ensina que essa autoridade é inerente à natureza e, portanto, derivada de Deus também. Essa é a doutrina da necessidade do Estado para garantir que o homem alcance sua perfeição material e espiritual3.

São Paulo aos Romanos fala de «poderes constituídos», o que significa que além dos pais e o Estado, este Mandamento refere-se igualmente a qualquer relação de autoridade legítima, como professores, mestres, patrões etc. Tanto mais importante é a relação, maior é autoridade4.

Sendo a relação espiritual a mais importante de todas, já que diz respeito à salvação da alma, a Igreja, de modo especial, exerce a suprema autoridade, ainda mais porque sua ereção não é natural, mas foi outorgada pelo próprio Deus Encarnado, Nosso Senhor Jesus Cristo.

Pecados contra este Mandamento

Tudo o que for dito acerca dos filhos, serve para aqueles que, na relação de autoridade, são o subalternos. Igualmente, o que é dito acerca dos pais, serve para os que são superiores. Desse modo, os pecados contra o IV Mandamento, em geral, é a inobservância dos deveres filiais e parentais.

São deveres dos filhos: amor, respeito e subserviência aos pais, especialmente à velhice. Também devem os filhos obedecer seus pais em tudo o que for lícito: “Filhos, obedecei a vossos pais segundo o Senhor; porque isto é justo” (Ef 6,1).

São também deveres dos pais: ser dignos do amor, do respeito, da servidão e da obediência de seus filhos. Além do dever de educá-los religiosa e intelectualmente, aceitando-os como Deus os deu, há a obrigação de sustentar quanto aos alimentos e evitar tudo o que possa ser nocivo ao seu desenvolvimento natural.

Em relação aos filhos

Desobediência grave aos pais5, pois deve o filho respeitá-los em palavras e ações. Odiar, agredir, maltratar, ofender ou ter vergonha deles. Também desejar ou dizer mal. Igualmente é grave o filho que não socorre as necessidades espirituais e temporais, especialmente na velhice.

Um filho não pode contrair o estado religioso se sua família for muito pobre e depender dele para o sustento. Semelhantemente, ele também não pode casar-se com intenção de desonrar sua família.

Aquele que maldiz sua mãe, morrerá (Ex 21,17).

Em relação aos pais

Espancar os filhos6. Faltar com o Batismo, tão logo for possível. Não prestar auxílio no desenvolvimento intelectual, principalmente na instrução religiosa no tocante às verdades da Fé: devem, portanto, ser espelho e guia moral dos filhos7.

Apesar de ser louvável, os pais não devem obrigar os filhos tomar a vida religiosa, tampouco obrigar a que se casem, quando pretender seguir a Religião.

Em relação aos patrões e empregados

Os patrões devem dispensar os empregados nas festas e domingos para que possam cumprir o preceito. Pecam muito gravemente quando não pagam o devido salário (constituindo um dos pecados que clamam a vingança dos céus) ou se lhes atrasa o pagamento.

Os empregados não devem faltar ao trabalho ou trabalhar menos do que foi acordado. Devem obedecer aos patrões no que for devido, como também tutelar os bens do patrão. Permitir que os patrões se prejudiquem financeiramente e, segundo Santo Afonso, não apenas pecam quando permitem que isso aconteça quando causado por estranhos (que não sejam colegas de trabalho), como são obrigados, por justiça, a restituição. Pecam, por fim, se cooperam com alguma fraude conhecida por parte do patrão.

Em relação aos casados

Os maridos pecam quando deixam faltar o sustento à mulher, ou se lhe aborrece quando grávida. Também pecam quando agridem suas esposas, tanto física como verbalmente (a mulher é sua companheira e não escrava). Por fim, o marido deve permitir e encorajar que sua esposa frequente a Religião.

As mulheres pecam se desobedecem ao marido naquilo que é devido, pois ele é o chefe da casa, como Cristo é o cabeça da Igreja. Pecam também, quando discutem com o marido que está irritado, pois dela se espera a mansidão8. Quando gestante, a mãe deve evitar tudo o que possa ser prejudicial ao feto, como fumar, beber, dançar ou fazer algum esforço não proporcionado.

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Deveres filiais

“Ouvi, meus filhos, os conselhos de vosso pai, segui-os de tal modo que sejais salvos. Pois Deus quis honrar os pais pelos filhos, e cuidadosamente fortaleceu a autoridade da mãe sobre eles. Aquele que ama a Deus o roga pelos seus pecados, acautela-se para não cometê-los no porvir. Ele é ouvido em sua prece cotidiana. Quem honra sua mãe é semelhante àquele que acumula um tesouro. Quem honra seu pai achará alegria em seus filhos, será ouvido no dia da oração. Quem honra seu pai gozará de vida longa; quem lhe obedece dará consolo à sua mãe. Quem teme ao Senhor honra pai e mãe. Servirá aqueles que lhe deram a vida como a seus senhores. Honra teu pai por teus atos, tuas palavras, tua paciência, a fim de que ele te dê sua bênção, e que esta permaneça em ti até o teu último dia. A bênção paterna fortalece a casa de seus filhos, a maldição de uma mãe a arrasa até os alicerces. Não te glories do que desonra teu pai, pois a vergonha dele não poderia ser glória para ti, pois um homem adquire glória com a honra de seu pai, e um pai sem honra é a vergonha do filho. Meu filho, ajuda a velhice de teu pai, não o desgostes durante a sua vida. Se seu espírito desfalecer, sê indulgente, não o desprezes porque te sentes forte, pois tua caridade para com teu pai não será esquecida, e, por teres suportado os defeitos de tua mãe, ser-te-á dada uma recompensa; tua casa tornar-se-á próspera na justiça. Lembrar-se-ão de ti no dia da aflição, e teus pecados dissolver-se-ão como o gelo ao sol forte. Como é infame aquele que abandona seu pai, como é amaldiçoado por Deus aquele que irrita sua mãe!” (Eclo 3,2-18).

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Notas

  1. Recomendamos a leitura do texto sobre o Matrimônio e o feminismo. ↩︎
  2. A Igreja ensina que os súditos ou cidadãos devem prestar obediência e respeito com um sentimento semelhante à piedade que os filhos têm para com seus pais (cf. Carta Encíclica Immortale Dei, 9), por isso dizemos que a base de qualquer autoridade e subserviência reside na família. ↩︎
  3. Entretanto, o Estado, apesar de sua constituição natural, não tem poder ilimitado. Deve-se obedecê-lo em tudo que não vá de encontro à lei de Deus e aos direitos da Igreja: “Pedro e os Apóstolos replicaram: Importa obedecer antes a Deus do que aos homens” (At 5,29).
    Mas no que é lícito, deve o Estado ser obedecido: “Pilatos então lhe disse: Tu não me respondes? Não sabes que tenho poder para Te soltar e para Te crucificar? E Jesus lhe respondeu” (Jo 19,10). ↩︎
  4. Diz a Escritura: “Porque com os pequenos se usará de comiseração; mas os poderosos serão poderosamente punidos” (Sb 6,7). ↩︎
  5. Quando o filho se casa, assume vida religiosa ou torna-se sacerdote, não está mais obrigado a obedecer aos pais, como ensina Santo Afonso. ↩︎
  6. Não significa, entretanto, que os pais não devem castigar seus filhos quando há necessidade. Sobre isso diz as Escrituras: “Quem poupa a vara odeia seu filho; quem o ama, castiga-o na hora precisa” (Pr 13,24). Nas mesmas Escrituras lemos que Deus castigou Eli por não ter censurado os filhos devidamente (cf. ISm 2,12-36). ↩︎
  7. Cabe aos pais a instrução na Fé e não às escolas. Tenham os pais isso em mente, ainda mais hoje em que cessaram as instituições que professam a Fé verdadeira. Do mesmo modo, os pais dedem criar e ter a vivência da Santa Religião com seus filhos (ir à Missa, rezar em família, especialmente o Santo Rosário…). ↩︎
  8. Pode o leitor achar absurdo isso, mas tenha em mente que as imperfeições do esposo não dão à mulher justificativa para ser ela imperfeita. Relata Santo Agostinho a resposta que sua mãe, Santa Mônica, deu a suas amigas ao perguntarem como ela conseguia viver em paz com o marido, que era irritadiço, enquanto elas mesmas sempre se queixavam dos seus: “Irmãs, os desgostos que passais com vossos maridos provêm tanto das imperfeições deles quanto das vossas; vós respondeis, e discutis, e exasperais seus ânimos, e assim estais sempre em guerra. Eu, quando vejo meu esposo irado, não abro a boca; sofro, rezo a Deus por ele e assim vivo em paz. Fazei vós o mesmo e também vivereis tranquilas” (Confissões I, 9, cap. 9, destaques nossos). ↩︎

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