
«Lembra-te de santificar o dia de sábado. Trabalharás durante seis dias, e farás toda a tua obra. Mas no sétimo dia, que é um repouso em honra do Senhor, teu Deus, não farás trabalho algum, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem teu servo, nem tua serva, nem teu animal, nem o estrangeiro que está dentro de teus muros. Porque em seis dias o Senhor fez o céu, a terra, o mar e tudo o que contêm, e repousou no sétimo dia; e por isso o Senhor abençoou o dia de sábado e o consagrou» (Ex 20,8-11. Dt 5,12-15).
Não basta ao fiel adorar a divindade e respeitar Seu Nome e Seus Santos. Deve ele também prestar-Lhe culto, principalmente público. Ou melhor, a sociedade deve guardar um momento para que, periodicamente, ela possa prestar culto de adoração a Deus.
Esse é o preceito positivo, a obrigação de a sociedade prestar culto público a Deus. O preceito negativo é abster-se das atividades que impeçam o culto, assim como o dever do descanso do corpo.
No trecho de Êxodo, o dia escolhido para a santificação semanal foi o sábado. A Tradição Apostólica, por sua vez, mudou esse dia para o domingo para o cumprimento do preceito. De fato, não havia mais motivos para que se sustentasse o sábado. Deus consagrou-o porque foi o sétimo dia da criação, em que Ele descansou. Em Deuteronômio a Escritura mostra ainda uma outra razão:
Guardarás o dia do sábado e o santificarás, como te ordenou o Senhor, teu Deus. Trabalharás seis dias e neles farás todas as tuas obras; mas no sétimo dia, que é o repouso do Senhor, teu Deus, não farás trabalho algum, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem teu servo, nem tua serva, nem teu boi, nem teu jumento, nem teus animais, nem o estrangeiro que vive dentro de teus muros, para que o teu escravo e a tua serva descansem como tu. Lembra-te de que foste escravo no Egito, de onde a mão forte e o braço poderoso do teu Senhor te tirou. É por isso que o Senhor, teu Deus, te ordenou observasses o dia do sábado (Dt 5,12-15).
Ora, o domingo é o dia da libertação da morte que vem do pecado. Por isso, os Apóstolos viram que há mais razão em se consagrar o domingo para o culto a Deus do que o sábado, como diz Liturgia:
Deus, que a dignidade da substância humana maravilhosamente criastes, e ainda mais maravilhosamente a reformastes (Rito Gregoriano).
Cornélio a Lápide, grande comentarista das Escrituras assim explica:
Existem muitas razões pelas quais os Apóstolos assumiram o dever de transferir a solenidade do sétimo dia para o primeiro dia da semana: I) foi neste dia que a luz começou a brilhar no mundo; II) foi neste dia que Nosso Senhor Jesus Cristo ressuscitou e fez passar a humanidade da vida das trevas e do pecado à gloriosa vida do Novo Adão; e III) foi também neste dia que o mundo começou a ser criado; e foi também neste dia quando começou a ser regenerado pelo Espírito Santo, que desceu sobre os Apóstolos. Assim é que a Igreja cristã, consagrando a Deus o Domingo, que corresponde simultaneamente ao primeiro dia da criação do mundo, e ao dia da ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, bem como à descida do Espírito Santo, reúne vários objetos, e todos igualmente próprios a excitar nossa piedade.
A Lei nova, portanto, não ab-rogou a velha, mas a aperfeiçoou, passando o dia de preceito para o domingo. Com o tempo o nome desse dia admirável tornou-se dies Domini (dia do Senhor) em oposição ao nome pagão “dia do Sol” (como no inglês: Sunday).
Fixado o dia do culto público, resta à autoridade da Igreja determinar como se deve cumprir o preceito deste Mandamento1. Está no Código de Direito Canônico:
O preceito de ouvir a Missa é cumprido por quem a assiste em qualquer rito católico que se celebre, ao ar livre ou em qualquer igreja ou oratório público ou semipúblico e nas capelas privadas dos cemitérios referidos no cân. 1190, mas não em outros oratórios privados, se a Sé Apostólica não tiver concedido este privilégio (cân. 1249, destaques nossos).
Os dias de preceito estão também indicadas no Direito da Igreja, de modo que este constitui o primeiro mandamento da Igreja: «Ouvir Missa inteira nos domingos e dias de guarda». Os dias são esses:
Os dias de preceito no Brasil são a) todos os domingos; b) as festas da Natividade, da Circuncisão, da Epifania, da Ascensão e do Corpo de Deus; c) as festas da Imaculada Conceição e da Assunção de Maria Santíssima; d) a festa de São Pedro e São Paulo; e) a festa de Todos os Santos (Concílio Plenário Brasileiro, 351 § 1 apud Del Greco).
Este Mandamento também prescreve o descanso necessário para que o fiel possa observá-lo e prestar culto integral à divindade. É fundamentado, pois, a suspensão das atividades comuns para toda a sociedade. Ademais o homem precisa recuperar-se fisicamente dos trabalhos diários, além do descaso também da alma e, finalmente, conviver com a família.
Pecados contra este Mandamento
Deixar de ouvir a Missa, que pode ser2:
- parcial, quando se perde as cerimônias até o ofertório (matéria leve);
- total, quando se chega após o ofertório (matéria grave)3.
Defeito aos que ouvem a Missa:
- adormecido ou voluntariamente distraído;
- portando-se com irreverência (conversando, rindo…);
- vestindo-se escandalosamente.
Não se abster das obras servis e trabalhos nos dias de preceito4.
*
Culto
O culto é um sinal de vassalagem e por isso a lei natural obriga que o fiel e a sociedade prestem culto a Deus. Não negamos, porém, a existência de outros tipos de cultos naturais, como o soldado para a bandeira da sua pátria, por exemplo.
Fins do culto
O culto divino é composto de quatro elementos5:
- latria ou adoração em que a criatura confessam a majestade e o senhorio de Deus;
- eucarístico ou ação de graças em que a criatura reconhece a prodigalidade divina e Lhe presta gratidão;
- impetratório ou oração em que a criatura reconhece sua dependência da divina Providência;
- propiciatório ou desagravo em que a criatura reconhece que as ofensas a Deus merecem sua aniquilação e pedem-Lhe misericórdia.
Formas do culto
O culto pode ser prestado a Deus de duas formas:
- interior, que consiste nos sentimentos internos do fiel, como Fé, Caridade e adoração;
- exterior, que consiste em manifestar sinais sensíveis.
A razão disto é que o homem é um ser composto, então não lhe basta render culto a Deus apenas interiormente, como apregoam muitos (normalmente os protestantes), revelando, na verdade, a malícia da preguiça e da indiferença com Deus. Não é suficiente, pois, o culto interno, mas a natureza humana exige o culto externo6.
Espécies de culto exterior
O culto exterior pode ser:
- particular, quando é o indivíduo que exerce ou, apesar de ser um grupo, não realiza um ato formal da autoridade religiosa;
- público, quando a Sociedade Religiosa, i.e., a Igreja, formaliza o ato de culto7.
Ato perfeito de culto
O ato que reúna em si os quatro fins ditos acima, será o ato principal da religião. Ora, tal ato é o sacrifício, como já foi dito. Se o ato sacrifical foi instituído pelo Fundador da sociedade eclesial, Nosso Senhor Jesus Cristo, e publicamente oficiado pela hierarquia, através dos sacerdotes, esse ato será o principal da Liturgia.
Ora, tal ato é a Santa Missa, o culto por excelência.
Direção do culto
O ato central do culto é adorar a Deus e aplacar a dívida de nossos pecados. Isso não significa que a adoração seja sempre feita de forma direta. O culto, então, pode ser dirigido aos Santos, pois sempre que se louva seus méritos, está-se ressaltando a benevolência divina:
[Deus], que sois glorificado no conselho dos Santos; e, coroando seus méritos, coroais vossos dons (Prefácio de Todos os Santos e Santos Patronos – galicano, destaques nossos).
No culto aos Santos, portanto, faz-se adoração indireta a Deus, Nosso Senhor.
Culto aos Santos
Aos Santos, evidentemente, não se deve prestar o culto de latria, pois que é destinado apenas a Deus. A eles, contudo, está reservado o culto de dulia — palavra grega que significa honra, veneração — e, para a Santíssima Virgem, a hiperdulia (máxima veneração).
A Santa Igreja permite o culto de dulia para nossa utilidade, como ela mesma atesta:
Neles [nos Santos], Vós [Deus] nos ofereceis o exemplo de conduta, o consórcio de comunhão, a intercessão que subsidia. Para que, havendo imposto tão numerosas testemunhas, com paciência corramos ao propósito de nosso certame e, com eles, recebamos a imarcescível coroa da glória (Prefácio de Todos os Santos e Santos Patronos – galicano, destaques nossos)
Culto das Relíquias
Relíquias são os objetos que pertenceram a um Santo ou que tiveram contato com seu corpo, ou mesmo partes do próprio Santo.
Apesar da objeção protestante, tem-se nas Escrituras inúmeros exemplos do culto e uso das relíquias, eis alguns:
Tomou o manto que Elias deixara cair, feriu com ele as águas, dizendo: ‘Onde está o Senhor, o Deus de Elias? Onde está Ele?’ Tendo ferido as águas, estas separaram-se para um e outro lado, e Eliseu passou (II Rs 2,14).
Ora, aconteceu que um grupo de pessoas, estando a enterrar um homem, viu uma turma desses guerrilheiros e jogou o cadáver no túmulo de Eliseu. O morto, ao tocar os ossos de Eliseu, voltou à vida, e pôs-se de pé (II Rs 13,21).
Tendo ela [a hemorroíssa] ouvido falar de Jesus, veio por detrás, entre a multidão, e tocou-lhe no manto. Dizia ela consigo: Se tocar, ainda que seja na orla do seu manto, estarei curada. Ora, no mesmo instante se lhe estancou a fonte de sangue, e ela teve a sensação de estar curada (Mc 5,27ss).
Cada vez mais aumentava a multidão dos homens e mulheres que acreditavam no Senhor. De maneira que traziam os doentes para as ruas e punham-nos em leitos e macas, a fim de que, quando Pedro passasse, ao menos a sua sombra cobrisse alguns deles (At 5,14s).
Deus fazia milagres extraordinários por intermédio de Paulo, de modo que lenços e outros panos que tinham tocado o seu corpo eram levados aos enfermos; e afastavam-se deles as doenças e retiravam-se os espíritos malignos (At 19,11s).
O culto às relíquias é um culto relativo ao Santo (ou a Deus se forem relíquias relacionadas a Nosso Senhor, normalmente ligadas à Paixão), pois os veneramos através de objetos intimamente relacionado a eles. A exposição e veneração pública delas têm origem na Igreja primitiva porque desde os primeiros séculos os fiéis tinham grande respeito pelos corpos dos mártires.
Para concluir, as relíquias podem ser:
- I grau ⇒ partes do corpo do Santo;
- II grau ⇒ objetos que pertenceram ao Santo;
- III grau ⇒ objetos tocados em relíquias de I grau.
________________
Notas
- A Igreja determina qual ato cumpre o Mandamento e quais dias se deve realizar esse ato. Igualmente, ela também coloca motivos que dispensam o fiel da obrigação da lei. São eles:
i) a impotência física (doença, viagem…); ii) impotência moral (distância, temor de algum prejuízo grave…); iii) dever de estado (funções indispensáveis como policial, enfermeiro…); iv) caridade pois o dever da caridade é mais preeminente que o da religião: portanto é lícito faltar a Missa para cuidar de um doente, por exemplo. ↩︎ - Para se assistir a Missa com cumprimento do preceito são necessários i) a presença corporal (basta uma presença moral, não precisa ver o padre, apenas saber pelo som ou pelos movimentos em que parte a Missa se encontra); ii) audição da Missa inteira (pode-se ouvir parte de uma Missa rezada por um padre e a outra parte por outro desde sejam de horários próximos); iii) assistência religiosa (à presença corporal é necessário acrescentar a intenção, ao menos implícita, de prestar culto a Deus e ter ação exterior). ↩︎
- Os moralistas afirmam que se o fiel chegar após a consagração, não cumpre preceito, não tendo obrigação de permanecer na igreja e sendo obrigado a encontrar outra Missa para cumprir o mandamento. ↩︎
- Pode-se trabalhar nos dias de preceito desde que por necessidade i) pública ou particular (algo que não possa ser interrompido sem grande prejuízo, como hospitais, ou pobreza extrema); ii) piedade (são os trabalhos braçais que tem por fim o culto divino); iii) caridade (trabalho para ajudar pessoas em pobreza extrema, levar remédios para doentes…); iv) costume (padeiros, confeiteiros, restaurantes…); v) dispensa (qualquer caso não listado acima, deve ter dispensa do pároco). ↩︎
- Existem inúmeros textos no site que tratam a questão do culto divino e da Liturgia católica, o Rito Romano e o curso de liturgia. ↩︎
- Não significa, entretanto, que os ritos exteriores não necessitam das intenções internas para que não se tornem ações meramente mecânicas e espiritualmente mortas. A intenção é a forma da obra. ↩︎
- É obrigação da Igreja, como Esposa de Cristo, honrar e satisfazer a Deus publicamente. Esse dever é exercido pelos seus representantes ordenados, especialmente os sacerdotes. ↩︎